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Projeto de Resgate da Cultura da Serra dos Mascates.

Trabalho de pesquisa sobre a Serra dos Mascates realizado pelos Professores Adriano Novaes e Antonio Carlos da Silva, Laboratório de Historia Regional e Centro de Documentação Histórica, Instituto Superior de Educação.

Produção do vídeo e Locução Victor S. Gomez

A imponente Serra dos Mascates faz parte do maciço da Serra da Mantiqueira, dividida entre três estados: Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro. Na porção do estado do Rio de Janeiro encontra-se a menor parte da Serra, que corresponde apenas 10%. A maior parte encontra no estado de Minas Gerais, seguido do de São Paulo.


No Estado do Rio de Janeiro a Serra da Mantiqueira ocupa toda a área do Médio Paraíba do Sul, margem esquerda do Rio Paraíba do Sul, e nesta área encontra-se o importante Parque Nacional de Itatiaia, o primeiro do Brasil (1937). Nesta mesma área também se localiza o Pico das Agulhas Negras, com 2.792,66 metros de altura, o ponto culminante do estado do Rio de Janeiro e a oitava montanha mais alta do Brasil.

De acordo com as bases do IBGE, a Serra dos Mascates faz parte de uma cadeia de pequenas montanhas (serrotes) que tem início no município de Barra do Piraí, passa pela cidade de Valença e termina no município de Rio das Flores, nas proximidades da foz do mesmo rio. Cada trecho da Serra em lugares diferentes recebe denominações especificas: No trecho entre a divisa do município de Barra do Piraí até o Bairro São Francisco, recebe o nome de Concórdia, com altitudes de 1.045 m; o trecho entre os bairros de Santa Cruz, e Centro de Valença, é conhecido pela denominação de Serra dos Mascates, com altitude de 1.032m; e toda a parte restante, localizada no município de Rio das Flores, recebe o nome de Serra da Boa Vista (este trecho também é denominado de Serra da Taquara). Existem também apelidos adotados a determinados morros localizados próximos a fazendas ou rios, como por exemplo: “Serra de Santa Catarina” no trecho entre aos bairros São Francisco e Santa Terezinha. Serra da Glória, no bairro de mesmo, e no município de Rio das Flores, Mirante da Boa Vista, com altitude de 619m, no centro da cidade, e Monte Formoso, com 784m.

A Serra dos Mascates também conhecida no século XIX como Serra Velha ou Serra de Valença, exerce o papel de divisor das águas dos rios Paraíba do Sul e das Flores. A vertente norte onde se assenta a cidade de Valença faz parte da bacia do rio das Flores, que por sua vez ajuda a formar a grande bacia do Rio Preto, formando o importante Vale do Rio Preto.

Desde os primórdios da fundação da Aldeia de Valença a Serra dos Mascates foi presença marcante na história da cidade. Imponente, assistiu o surgimento da cidade e acompanha assustada o avanço da área urbana sobre suas encostas, tendo por conseqüência a destruição de seus últimos resquícios de vegetação nativa e a extinção de suas nascentes.

O Registro mais antigo sobre a Serra era uma transcrição de um mapa datado de 1819, referente ao Tombo das Terras dos Índios Coroados, elaborado em 1836. Esse documento que constituía a certidão de nascimento da cidade de Valença foi destruído por um incêndio no Casarão da Cultura em 2001. Outros documentos referentes à concessão de sesmarias próximas a atual área urbana da cidade de Valença também fazem referencia a Serra. Porém, nenhuma cita a denominação atual de Serra dos Mascates, mas sim, de “Cordilheira da Serra d’Aldeia” ou simplesmente “Serra da Aldeia”. Em meados do século XIX a Serra passa a ser denominada “Serra Velha”, como consta em vários documentos desta época. A designação “Mascates” aparece pela primeira vez em uma “Memória Justificativa para o Saneamento”, publicada em 1894. A toponímia Mascates, provavelmente, se deve aos viajantes que se dirigindo ao Rio de Janeiro do interior ou vice-versa dessa Serra utilizavam-se, mascateando suas mercadorias.


Em janeiro de 1822, ao regressar a cidade do Rio de Janeiro após ter explorado, em diversas viagens cientificas, territórios do sul e centro-sul do Brasil, o naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire constatara que parte de sua coleção coletada nas províncias de do Rio de Janeiro e Minas Gerais havia se estragado. Aborrecido, porém resignado, resolveu empreender sua última viagem antes de regressar a França. Assim, entre os meses de janeiro e maio de 1822, voltou atravessar as trilhas de mulas que cortavam a Serra do Mar, o Vale do rio Paraíba do Sul e Mantiqueira em direção ao sul de Minas, tendo a oportunidade de percorrer o “Caminho do Comércio”, aberto há poucos anos com o objetivo de articular a então sede do Império português à zona de produção de mantimentos das terras altas da Mantiqueira. Em quatro de fevereiro quando se aproxima da futura cidade de Valença, observou a paisagem e anotou em seu diário:

“Um pouco antes de chegar à Aldeia, avista-se o pico de elevada montanha imensa extensão de terreno, notando-se de todos os lados montanhas cobertas de mato”.

Saint-Hilaire já havia passado por Valença antes, em 1819, quando realizou sua primeira viagem a província Minas Gerais. Comparando, observou o aumento da população:

“As terras nos arredores da Aldeia estão um pouco mais povoadas; atualmente nelas se contarão umas sessenta casas”.

Como foi dito, o ilustre naturalista percorreu o caminho do Comércio que em Valença chagava-se pela atual Serra da Glória, descendo por onde fica atualmente o Hospital de Clínicas da Unimed e Rua Vito Pentagna, no Bairro do Benfica.

Nesta mesma ocasião estava sendo construída a Estrada da Polícia pela Intendência de Polícia do Rio de Janeiro. A idéia era ligar a cidade do Rio de Janeiro às cidades da comarca de Rio das Mortes, na província Minas Gerais. A Estrada deveria cortar a região do Vale do Paraíba, passando pela fazenda de Francisco Rodrigues Alves - onde mais tarde irá surgir a cidade de Vassouras - e pela Aldeia de Valença.

No município de Valença, a Estrada da Polícia, tinha início nas margens do Paraíba do Sul, em terras da fazenda Santa Mônica, onde mais tarde irá surgir distrito de Barão de Juparanã. Desta fazenda tamava-se a direção de Quirino para depois galgar o lado sul da Serra dos Mascates, descer para a Vila de Valença, através da atual Rua Rodrigues da Cruz. Depois de percorrer as atuais Ruas Domingos Mariano, dos Mineiros, Praça Visconde do Rio Preto, Rua João Rufino e Dr. Humberto Pentagna, a importante Estrada toma a direção de Rio Preto, passando antes pela Passagem, Charneca, Pentagna, Chaves e finalmente Parapeúna, na divisa com o Estado de Minas Gerais.

Passado alguns anos o trecho da Estrada da Polícia que atravessava a Serra dos Mascates foi substituído por uma volta da Serra, através dos Bairros Santa Cruz e João Dias. O objetivo de tal mudança era de se evitar a subida íngreme da Serra. Mesmo deixando de ser o eixo principal de tão movimentada Estrada o antigo leito da Polícia existente na Serra continuou durante quase todo o século XIX sendo freqüentado por moradores locais que possuíam chácaras e sítios atrás da Serra. Com o advento da Estrada de Ferro as Estradas de Terras perderam sua importância. O Relatório do Presidente da Província de 1857 prevê o seguinte sobre a Estrada da Polícia:

“É uma das mais transitadas da Província, porque partindo do rio Preto corta os municípios de Valença e Vassouras no meio. A produção que desce por ela é enorme. Até São João Del Rei se serve dessa via. Com a E.F. Pedro II, logo que galgue a serra, esta e a do Presidente e outras paralelas tendem a serem abandonadas”.

A Estrada da Polícia e outras que cortavam o território de Valença nada tinha haver com o transporte de ouro. Atendia ao transporte de víveres, como o gado de corte e principalmente o café que era produzido nesta região.

Duas pedreiras localizadas na Serra dos Mascates forneceram granitos à cidade de Valença: a “Pedreira da Câmara”, durante todo o século XIX, e “Nossa Senhora Aparecida”, durante o século XX e XXI, e ainda em funcionamento.

Foi através dos mananciais da Serra dos Mascates que durante todo o século XIX e as primeiras décadas do XX que população foi servida de água potável.

Dois eram os mananciais que até 1915, abasteciam de água a cidade de Valença, o do Machado ou José Alves (Benfica) e o da Serra dos Mascates (Laranjeiras). O mais antigo foi o do Machado.

O projeto de canalização do manancial do Machado foi realizado em 1838 pelo Major César Cadolino, que atendia ao primeiro projeto de urbanização da então Vila de Valença.

Com o paulatino crescimento populacional da então cidade de Valença, surgiu a necessidade de novas fontes de abastecimento de água potável. Em 1870 formou-se uma comissão composta por vereadores da Câmara Municipal a fim de dar parecer sobre a necessidade de construção novo reservatório, bem como orçamento para realização da obra.

Em 20 de novembro de 1873, a firma “Faria, Ariosa, Villaronga & Companhia” firmava contato com a Câmara Municipal de Valença para a construção do novo abastecimento de água potável da cidade de Valença, aproveitando os mananciais da Serra dos Mascates. Comprometia a firma contatada a construir na chapada do morro do Manoel Hipólito (atual condomínio Mata Atlântica), um reservatório com dois compartimentos (ainda hoje existentes).

Em 1894, ainda era insuficinte o serviço de abastecimento de águas na cidade. O engenheiro Ernesto C. de Araujo Viana, chefe da Comissão do Saneamento de Valença, em seu relatório publicado nesse ano, cauculou o volume dos mananciais da Serra do Mascate e dos denominados José Alves ou Machado (Benfica), o que foi feito após demorada estiagem, chegando ao seguinte conclusão: o manancial da Serra do Mascates dava, em 24 horas, um fornecimento de 98.000 litros, e o do Benfica, 40.000 litros. A esse tempo, para uma população de cerca de 4.000 habitantes, cabia, apenas, a cada individuo, a insignificante percentagem de 34,5 litros. O engenheiro Araujo Viana faz a seguinte referência:

“Assisti, e, por experiência própria, tive oportunidade de sofrer as consequências da falta d’água em Valença. Depois das 9 horas da manhã as torneiras de minha casa não deitavam uma gota.”

Neste mesmo ano foi firmado o contrato entre a Câmara Municipal de Valença e o engenheiro Dr. Ernesto da Cunha Araújo Vianna e o construtor João Marques Faria, para a execução do projeto de substituição dos canos de barro por tubos de ferro, na canalização das águas da Serra dos Mascates. Neste contrato se obrigavam eles a construir uma nova represa mais abaixo da existente, na dita Serra dos Mascates, fazendo uma barragem de alvenaria de pedra e argamassa de cimento e areia, e modo e serem por aquelas represas captadas as águas, que corriam pelo aqueduto existente e as que nasciam em nível inferior, ou que, por efeito de infiltração, não eram aproveitadas. Toda a linha de canalização desde a nova represa deveria ser ligada ao o novo reservatório de distribuição (atual sede da SECTUR), que deveria ser construído com capacidade para armazenar 77.481 mil litros. O projeto foi levado a efeito.

Em função da grande seca de 1914, que teve como conseqüência uma crise de abastecimento de água potável na cidade, a Câmara Municipal estudou a possibilidade de ampliar a rede de abastecimento. Nesta época a cidade era abastecida apenas pelo o Manancial de Serra dos Mascates (o maior) e o do Manancial do Benfica.

Segundo o memorialista valenciano Luis Damasceno Ferreira, por conseqüência desta crise de abastecimento irrompeu na cidade uma epidemia de febre tifo, que ceifou várias vidas.

Aos poucos novas fontes capitação de água foram sendo construídas na cidade. As nascentes do Benfica, em grande parte em terras da família Pentagna, foram aproveitadas e ampliadas. Apenas a primitiva de José Alves foi inutilizada pela Câmara Municipal em 1918.

A mais de meio século o reservatório da Serra dos Mascates não é utilizado como fonte de abastecimento de água potável a cidade de Valença. Consta que em curto periodo de tempo atendeu a uma fábrica de doces “Danger” que ficava situada a alguns metros a baixo do reservatório.

O Mato das Águas localizado nessa Serra e onde se encontra inúmeras nascentes é hoje área de preservação permanente, considerada de interesse ecológico por Lei Orgânica Municipal.

Desde a construção de um edifício pela Embratel para suas retransmissões, na década de 1970, no topo da Serra, muitos valencianos começaram a freqüentar o local. Principalmente depois do calçamento da estrada de acesso.

Apesar das agressões que a Serra vem sofrendo ao longo dos anos como loteamentos inadequados, e mais recentemente, o incêndio nas matas (2007) e desmatamentos, a bela paisagem ainda nos surpreende. Podemos imaginar qual deveria ser a impressão que muitos viajantes e mascates vindos do Rio de Janeiro tinham ao atravessar a Serra e se deslumbrar com paisagem que descortinava diante de seus olhos. Uma extensa região salpicada de colinas com um longínquo horizonte com as Serras de Minas, tendo na sua base a cidade de Valença.

Não de hoje que inúmeros projetos têm sido ventilados para o aproveitamento da Serra dos Mascates: mirantes, teleféricos, área de proteção ambiental e etc... O certo é que em 2004 o Instituto Estadual de Patrimônio Cultural – INEPAC - tomou a iniciativa de tombar a Serra, passando ser considerada patrimônio histórico do Estado do Rio de Janeiro.

Em 2008 foi criado por um grupo de abnegados cidadãos valencianos, com intuito de proteger e defender a Serra da destruição de sua fauna e flora, o SOS SERRA DOS MASCATES. Desde então foram realizadas inúmeras palestras educativas para a população em geral e campanhas de reflorestamento. Importantes parceiros como a Fundação D. André Arcoverde, através do Centro de Ensino Superior de Valença contribuiram irrestritamente com esta importante ação cidadã.
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Fontes utilizadas:

1VIANNA, Ernesto da Cunha de Araújo. Saneamento de Valença: Memória Justificativa dos Planos Apresentados a câmara Municipal de Valença. Rio de Janeiro: Typographia “Mont’Alverne”,1894, p.43.

2MARQUESE, Rafael de Bivar. Diáspora africana, escravidão e a paisagem da cafeicultura no Vale do Paraíba oitocentista. Almanack braziliense.n.07,p.139, maio de 2008.

3Relatório do Presidente da Vice Presidente da Província do Rio de Janeiro, João Manoel Pereira da Silva para Assembléia Legislativa. Agosto de 1857.p.36.

4VIANNA, Ernesto da Cunha Araújo. Op.Cit.

5FERREIRA, Luiz Damasceno. Historia de Valença: 1803 -1924. Valença: Editora Valença S. A., 2ª edição, 1978, p.128-135.

6 Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro. Secretaria de Estado de Cultura. 1.12.2004. Ano XXX, n 222. Parte 1. p.61-2. “Tombamento Provisório nos termos do Inciso II do Artigo 5° do Decreto n° 5.808 de 13.07.1982, de acordo com o Processo n°E-18/001004/2004: 3. Sítio Histórico e Paisagístico da Serra dos Mascates. “O Tombamento do sítio histórico e paisagístico da Serra dos Mascates, compreendendo as vertentes dos morros que integram a Serra da Boa Vista, voltados para a área urbana de Valença, onde se encontra o ponto culminante da cidade, a 1.032 metros de altitude, limitada pela linha de cumeada e o sopé do maciço que segue pelos bairros do parque Pentagna, Jardim Agelina, Laranjeiras, até o bairro Santa Cruz, inclusive”.

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